
A Idade do Bronze (3200-1200 a.C.) foi um período de transformações profundas, marcado pelo desenvolvimento de redes comerciais que interligaram regiões distantes e diversas culturas. Entre os produtos que circularam nessas rotas, o queijo destacou-se como um alimento versátil, nutritivo e de longa conservação, características que o tornaram ideal para o transporte e o comércio. Mas o queijo não era apenas um alimento; era também um símbolo de inovação técnica e de adaptação às condições ambientais e sociais da época. Como é que um produto aparentemente simples se tornou tão relevante? A resposta encontra-se na interseção entre a gastronomia, a economia e a cultura.
O queijo como produto técnico e cultural
Produzir queijo na Idade do Bronze era mais do que uma prática culinária; era uma solução engenhosa para preservar o leite em climas quentes e para aproveitar ao máximo os recursos disponíveis. A fermentação e a coagulação do leite, processos que transformam um líquido perecível num alimento sólido e duradouro, eram verdadeiros avanços tecnológicos. Estes métodos permitiam não só prolongar a vida útil do leite, mas também criar um produto com sabores e texturas únicos, que variavam consoante o tipo de leite utilizado (vaca, cabra ou ovelha), as condições climáticas e as técnicas de produção.
Imagine um queijo fresco, de textura macia e ligeiramente granulada, com um aroma ácido e herbal, típico das pastagens mediterrânicas. Ou um queijo mais curado, de sabor intenso e salgado, com uma crosta endurecida pelo tempo e pelo contacto com o ar seco do Médio Oriente. Estes queijos não eram apenas alimentos; eram também expressões do ambiente e da cultura de quem os produzia.
Além disso, o queijo tinha um papel simbólico. Em algumas culturas, era associado a rituais religiosos e a oferendas aos deuses, enquanto noutras era um alimento reservado às elites. A sua produção e consumo refletiam, assim, as hierarquias sociais e as crenças espirituais da época.
Rotas comerciais e o papel do queijo
O comércio na Idade do Bronze era impulsionado por uma rede complexa de rotas terrestres e marítimas que ligavam regiões como o Egito, a Mesopotâmia, o Mediterrâneo e a Europa Central. Nessas rotas, o queijo desempenhava um papel duplo: era tanto uma mercadoria valiosa como um alimento essencial para os mercadores e viajantes.
A sua durabilidade e valor nutricional tornavam-no ideal para longas viagens. Um pedaço de queijo curado podia resistir ao calor e à humidade, fornecendo energia e proteínas aos viajantes. Mas o queijo não era apenas um alimento prático; era também um produto de luxo, apreciado pelas elites urbanas das grandes cidades-estado da Mesopotâmia e do Egito.
Por exemplo, em Ugarit, uma cidade portuária na atual Síria, foram encontrados registos que mencionam o comércio de queijo entre os povos do Mediterrâneo Oriental. Estes documentos, escritos em tabuletas de argila, revelam que o queijo era frequentemente trocado por metais preciosos, tecidos e outros bens de alto valor.
Curiosamente, o queijo também desempenhava um papel na diplomacia. Há registos de queijos enviados como presentes entre governantes, simbolizando alianças e boas relações. Um exemplo famoso é o de um faraó egípcio que recebeu queijos de cabra como parte de um tributo de uma região vizinha.
O queijo mais antigo do mundo
Em 2014, arqueólogos descobriram o que pode ser o queijo mais antigo do mundo, numa tumba egípcia datada de cerca de 3200 a.C. Este queijo, encontrado em forma de um pó branco endurecido, estava envolto em tecido e colocado ao lado de outros alimentos e objetos funerários. A análise revelou que era feito de uma mistura de leite de vaca e de ovelha ou cabra, e que continha traços de uma bactéria que causa brucelose, uma doença transmitida pelo consumo de produtos lácteos não pasteurizados.
O impacto económico e cultural do queijo
O comércio de queijo na Idade do Bronze não se limitava a trocas materiais; tinha também um impacto cultural significativo. À medida que o queijo circulava entre diferentes regiões, levava consigo técnicas de produção, sabores e tradições. Este intercâmbio cultural contribuiu para a diversificação das práticas gastronómicas e para a criação de novas variedades de queijo.
É provável que as técnicas de produção de queijo tenham sido transmitidas dos povos do Crescente Fértil para a Europa, onde foram adaptadas às condições locais.
Além disso, o queijo era um indicador de status social. Nas sociedades urbanas da Idade do Bronze, o acesso a queijos de alta qualidade era muitas vezes limitado às elites, enquanto as classes mais baixas consumiam variedades mais simples. Esta distinção social refletia-se também na forma como o queijo era apresentado e consumido. Enquanto os ricos podiam servir queijos em pratos decorados e acompanhados de vinho, os pobres comiam-no como parte de uma refeição simples, muitas vezes com pão e vegetais.