
Em Em Busca do Tempo Perdido, Marcel Proust imortaliza um dos momentos mais célebres da literatura ao recordar a Tia Léonie, que oferecia ao narrador uma madalena, aquele pequeno bolo amanteigado tão típico da França, depois de o mergulhar numa chávena de chá ou infusão de flor de tília. Este gesto simples, quase banal, transforma-se numa poderosa chave para o passado.
Ao provar a madalena embebida no chá, o narrador é subitamente transportado para as memórias da sua infância, numa torrente de recordações que emergem com uma intensidade quase avassaladora. Este episódio não é apenas uma celebração da memória involuntária, mas também uma demonstração do poder dos sentidos, especialmente do paladar e do olfato, em despertar emoções e experiências há muito esquecidas.
A madalena, com a sua delicadeza e simplicidade, contrasta com a complexidade do universo sensorial de Proust. Apesar da sua fragilidade física, o autor revela uma fome insaciável pela vida, pelas sensações e pelos detalhes que compõem a existência. A comida, nesse contexto, não é apenas um prazer, mas um portal para o passado, um elemento que conecta o presente ao que parecia perdido no tempo. A madalena torna-se, assim, um símbolo da relação íntima entre os sentidos e a memória, um pequeno fragmento de doçura que contém um mundo inteiro de lembranças.