
Na Roma Antiga, enquanto os fóruns e as basílicas serviam como palcos para a política e a justiça, eram as tabernas e os termopólios que pulsavam como verdadeiros corações da vida social quotidiana. Estes estabelecimentos, muito mais do que simples locais para comer e beber, funcionavam como autênticos centros de socialização onde as diferentes camadas da sociedade romana se encontravam, trocavam informações e fortaleciam os seus laços comunitários. Que papel desempenhavam estes espaços na estrutura urbana e social romana? Como se organizavam e que serviços ofereciam aos seus frequentadores? Uma análise destes espaços revela-nos não apenas hábitos alimentares, mas toda uma dimensão cultural e social da vida urbana romana que transcende a mera subsistência.
Os espaços comerciais de alimentação na cidade romana
A partir do século II a.C., com a expansão do império romano e o consequente aumento da complexidade urbana, assistiu-se a uma especialização crescente dos estabelecimentos comerciais nas cidades romanas. Este fenómeno coincidiu com um período de prosperidade económica sem precedentes, resultante das conquistas militares que trouxeram para a península itálica não só riquezas materiais, mas também novos habitantes, muitos deles escravos, e influências culturais diversas.
As evidências arqueológicas demonstram que nenhuma taberna romana pode ser datada de antes do século II a.C., o que sugere uma ligação direta entre o desenvolvimento destes estabelecimentos e as transformações socioeconómicas deste período. É provável que as padarias urbanas, que também surgiram nesta época, tenham desempenhado um papel fundamental no aparecimento de estabelecimentos especializados em alimentação, uma vez que o calor necessário para a cozedura em larga escala conduziu tanto à criação de fornos comunitários como à comercialização de alimentos quentes.
A combinação de uma sociedade com dinheiro disponível, uma especialização crescente entre os estabelecimentos comerciais e um mercado retalhista subitamente massivo, mas ainda em crescimento, deve ter sido irresistível para potenciais proprietários de tabernas.
Tipologia e terminologia: a confusão das fontes
Um dos maiores desafios para os investigadores contemporâneos reside na classificação precisa dos diferentes tipos de estabelecimentos de alimentação romanos. Paradoxalmente, enquanto para o período grego a escassez de evidências arqueológicas dificulta a identificação segura de tabernas, para o período romano é a abundância de dados que complica o panorama.
Inúmeros edifícios descobertos entre as ruínas urbanas romanas foram identificados genericamente como tabernas romanas devido às suas características arquitetónicas, instalações fixas como fornos e balcões, e conjuntos de artefactos encontrados. No entanto, existe uma dependência excessiva do registo literário para identificar e categorizar estes estabelecimentos, baseando-se quase exclusivamente nos nomes latinos que lhes foram atribuídos casualmente durante as descobertas nos séculos XVIII e XIX, sem qualquer corroboração no registo arqueológico.
Esta prática traduziu-se numa rede urbana romana de edifícios rotulados como tabernae, popinae, cauponae e thermopolia. A estes termos literários está associado um conjunto de atividades, apesar de as referências nunca oferecerem qualquer sugestão das funções específicas ou características físicas que possam ser reconhecíveis no registo arqueológico atual. Assim, as tabernae são consideradas, de forma muito geral, como lojas e tabernas; as cauponae como restaurantes e hotéis; as popinae como restaurantes e bares; e os thermopolia como bares.
Características e funções dos termopólios
Os termopólios, cujo nome deriva do grego e significa literalmente “vendedor de [comida] quente”, eram estabelecimentos facilmente identificáveis pela presença de grandes recipientes de terracota (dolia) embutidos em balcões de alvenaria. Estes recipientes serviam para armazenar e manter quentes os alimentos que eram vendidos aos clientes.
A configuração típica de um termopólio incluía um balcão voltado para a rua, permitindo que os transeuntes comprassem comida para levar ou consumissem no local, geralmente de pé. Alguns termopólios mais elaborados possuíam também espaços interiores com mesas e bancos onde os clientes podiam sentar-se para comer.
As paredes destes estabelecimentos eram frequentemente decoradas com pinturas murais representando os alimentos disponíveis ou cenas mitológicas, funcionando simultaneamente como menu visual e decoração. Em Pompeia, por exemplo, foram encontrados termopólios com representações de aves, peixes e outros alimentos que provavelmente indicavam o que estava à venda.
O menu típico de um termopólio incluía sopas, guisados, pão e vinho, oferecendo assim refeições rápidas e acessíveis para a população urbana, especialmente para aqueles que não tinham condições para cozinhar nas suas próprias habitações, como era o caso de muitos habitantes de insulae (edifícios de apartamentos).
As tabernas como centros de socialização
As tabernas romanas, por sua vez, eram estabelecimentos mais versáteis que podiam funcionar como lojas, oficinas ou locais de venda de comida e bebida. Quando dedicadas à alimentação, as tabernas ofereciam um ambiente mais propício à socialização prolongada do que os termopólios.
Estes espaços desempenhavam um papel crucial na vida social urbana, servindo como pontos de encontro onde se partilhavam notícias, se discutiam negócios e política, e se estabeleciam relações sociais. Para muitos romanos de classes mais baixas, as tabernas representavam uma extensão do espaço doméstico, um “terceiro lugar” entre a casa e o trabalho onde podiam relaxar e socializar.
As tabernas eram frequentadas por uma clientela diversificada, desde trabalhadores e artesãos até soldados e viajantes. Embora fossem por vezes associadas a comportamentos considerados moralmente duvidosos pela elite romana, como o jogo, a prostituição e o consumo excessivo de álcool, estas representações negativas refletem mais os preconceitos da classe alta do que a realidade quotidiana destes estabelecimentos.
Como observa Suetonius na sua descrição do imperador Vitélio, existiam normas sociais que governavam o comportamento apropriado nestes espaços públicos de alimentação. O hábito de Vitélio de “roubar comida de altares fumegantes ou pedaços já meio comidos dos balcões das tabernas da cidade” era considerado deplorável e manchava o seu caráter, indicando que existiam regras implícitas sobre onde, quando, como e com quem se podia comer fora.
Distribuição urbana e impacto económico
A distribuição dos estabelecimentos de alimentação nas cidades romanas não era aleatória, mas seguia padrões específicos relacionados com a densidade populacional, fluxos de circulação e proximidade a outros edifícios públicos. Em Pompeia, por exemplo, os termopólios e tabernas concentravam-se ao longo das vias principais e próximos de edifícios como termas, teatros e anfiteatros, onde podiam servir um grande número de potenciais clientes.
Estes estabelecimentos representavam uma parte significativa da economia urbana romana, gerando emprego e facilitando a distribuição de alimentos processados. Além disso, funcionavam como importantes pontos de ligação nas redes de comércio alimentar, conectando produtores rurais com consumidores urbanos.
A análise dos restos arqueológicos, incluindo cerâmica, ossos de animais e sementes carbonizadas, permite reconstruir parcialmente os menus oferecidos nestes estabelecimentos e compreender melhor as cadeias de abastecimento que os sustentavam. Estes dados revelam uma dieta variada que incluía cereais, legumes, frutas, carne, peixe e vinho, adaptada às preferências locais e às disponibilidades sazonais.
Perspetiva comparativa: da Grécia a Roma
Ao contrário do que se verifica para o período romano, as tabernas gregas (kapaleion) são mais difíceis de identificar arqueologicamente. Tipicamente, a presença de um kapaleion é sugerida pela descoberta de um número elevado de copos para beber e recipientes de armazenamento como ânforas e jarros.
Esta diferença na visibilidade arqueológica entre estabelecimentos gregos e romanos não é meramente acidental, mas reflete uma realidade estatística que merece explicação. A transição do mundo grego para o romano trouxe consigo uma transformação profunda na organização urbana e nas práticas de consumo, resultando numa proliferação sem precedentes de espaços comerciais dedicados à alimentação.
O século II a.C. marcou um ponto de viragem nesta evolução, coincidindo com um período de grande prosperidade na história romana. A conquista do Mediterrâneo trouxe muitas vitórias e realizações, com o resultado de que a península itálica ficou inundada de inúmeros novos imigrantes, ideias energizantes e influências, e um afluxo sem paralelo de dinheiro. De todos os beneficiários desta Idade de Ouro, foram os centros urbanos que registaram os maiores ganhos globais.
Implicações socioculturais dos espaços de convívio
Os espaços de convívio na Roma Antiga transcendiam a sua função primária de fornecimento de alimentos e bebidas, constituindo verdadeiros microcosmos da sociedade romana. Nestes locais, as hierarquias sociais eram simultaneamente reforçadas e subvertidas, criando um ambiente único onde diferentes classes sociais podiam interagir, ainda que dentro de certos limites.
Para a elite romana, frequentar tabernas e termopólios era geralmente visto com desdém, considerado um comportamento impróprio para o seu estatuto. No entanto, para a maioria da população urbana, estes estabelecimentos eram componentes essenciais da vida quotidiana, oferecendo não apenas sustento, mas também oportunidades de lazer e socialização que de outra forma não estariam disponíveis.
A análise destes espaços de convívio permite-nos compreender melhor as dinâmicas sociais da Roma Antiga, revelando uma sociedade mais complexa e interconectada do que as fontes literárias, predominantemente elitistas, por vezes sugerem. Qualquer visão sobre as regras de onde, quando, como e com quem se podia comer fora pode, portanto, levar a uma compreensão mais rica da organização das redes sociais antigas e do papel que comer fora tinha na formação das comunidades.



