A transformação das refeições e dos costumes à mesa

Pratos, copos e talhares elegantemente dispostos sobre mesa preta

No centro das grandes casas senhoriais, destacavam-se os servidores das salas de jantar e o pessoal da cozinha, que não apenas dominavam as boas maneiras à mesa, mas também se tornavam mestres na arte de cozinhar. Com engenho e criatividade, descobriram que era possível transformar ingredientes simples e acessíveis em pratos que rivalizavam com os banquetes dos ricos. Substituíam as caras especiarias por ervas aromáticas locais, criando receitas que agradavam tanto aos menos abastados quanto aos senhores. Não era raro que os nobres frequentassem tabernas para provar essas iguarias ou as encomendassem para suas próprias mesas. Assim, até mesmo um prato humilde como a polenta, quando servido numa bandeja de prata, adquiria o prestígio digno de um anfitrião abastado e dos seus convidados.

Com o passar do tempo, os utensílios de mesa evoluíram, e com eles, a estrutura das refeições. A salada, que outrora marcava o início das refeições, foi gradualmente substituída por um “aperitivo”. Na Toscana, esse momento inicial era chamado de “camangare”, enquanto na Ligúria surgia o termo “incisame”, derivado de “incominciame”, ambos refletindo o conceito de começar a refeição. Essa mudança linguística e cultural ilustra uma transformação significativa nos hábitos alimentares. Curiosamente, do ponto de vista nutricional, a prática medieval de iniciar com salada, ainda preservada em algumas famílias da Ligúria e Provença, era bastante saudável. Contudo, o estilo francês, que passou a influenciar grande parte da Europa, preferia servir a salada como acompanhamento, até mesmo com carnes assadas, o que tornava a refeição menos leve e mais difícil de digerir.

No norte da Europa, a salada era frequentemente vista com desdém, sendo considerada alimento para animais ruminantes. Essa visão pode parecer chocante, mas até os anos 1960, as mercearias das cidades do norte, incluindo Paris, não ofereciam vegetais particularmente frescos ou atraentes. A carne dominava as prateleiras, e até o peixe era mais valorizado do que os vegetais, que eram relegados ao papel de mero acompanhamento. Um detalhe curioso é que a primeira couve-flor só chegou a Berlim no final do século XIX, trazida por Francesco Cirio, um pioneiro na exportação de vegetais.

Durante os tempos modernos, a carne de vaca tornou-se relativamente acessível e apreciada, mas as carnes de caça continuaram a ser as mais valorizadas, devido à sua raridade e ao alto custo. Entre os costumes que desapareceram, destaca-se o hábito de servir um bolo de amêndoa e pinhão no início da refeição, acompanhado por um vinho Malvasia forte. Esse tipo de tradição foi sendo substituído à medida que a influência francesa se consolidava em toda a Europa. Desde o início do século XVIII até o século XX, a França exerceu uma hegemonia cultural sem precedentes. Na corte de São Petersburgo, falava-se francês, e em Viena, o francês era a língua diplomática por excelência, pelo menos na escrita.

Literatura recomendada
Braudel, Fernand, The Structures of Everyday Life: Civilization and Capitalism 15th-18th Century, Harper & Row, 1981.
Davidson, Alan, The Oxford Companion to Food, Oxford University Press, 1999.
Tannahill, Reay, Food in History, Crown Publishers, 1988.

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